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Como explicar à pessoas, sem as ferir, que na grande maioria dos casos as
suas casas são um horror?
Que parecem museus de todos os horrores?

No seu interior, as casas parecem hoje templos presididos pelo olho
polifémico, a televisão.
Exposta num altar com rodas que nunca se move , a estupida caixa converte-se
num foco central de um espaço que tende a ser acumulação de sofás e
poltronas. Em seu redor, preenchendo tudo, inúmeras mesinhas e estantes
repletas de cinzeiros, peças de loiça sem valor, caixinhas, estatuetas e
objectos múltiplos que nunca são usados.
Como um museu virtual, daqueles que se percorrem obrigatoriamente nas
habituais viagens turisticas programadas . E tudo isto misturado com uma
multiplicidade de plantas, onde nunca falta um tronco do Brasil, que conferem
a estas divisões um caracter selvático.

E como a luz natural, a grande aliada da Arquitectura, o seu material
imprescindivel, é persona non grata para a boa visão da caixa tonta, umas
cortininhas conseguem tapar a enorme superficie vidrada que o arquitecto
decidiu um dia colocar no terraço. De facto, o terraço, ou a sua
caricatura, parece ser o elemento com que se rematam quase todas estas salas.

Se esta descrição da realidade de muitas casas nos faz pensar que, mais do
que uma casa para habitar, estes são espaços para adorar a televisão,
podia faser um paralelo sobre a forma como muitas vezes se concebe a
Arquitectura em que estes espaços estão imersos. E com a mesma
superficialidade com que ocorre tudo o que acabei de descrever , assim
também se cria muita da arquitectura das casas que nos rodeiam.
Como museus dos caprichos recolhidos pela superficialidade dos arquitectosna
frivolidade das revistas.
Como mausoleus onde os seus utilizadores e os arquitectos enterram as
paixões mais inconfessáveis. Como uma exaltação universal daquilo a que
os classicos chamam horror vacuis (medo do vazio). Feito sem pensar. Porque
pensar é sempre a solução, é o que é logico para o homem. Para o
arquitecto, na hora de conceber os espaços. Para os utilizadores, na hora de
usufruir deles.

Texto extraido de “a ideia construida” de Alberto Campo Baeza